segunda-feira, 1 de junho de 2009

AS REPRESENTAÇÕES PSICO-PATOLÓGICAS E A CONVERSÃO DO AFRO-AFRICANO



O Terceiro Mundo não deve se contentar em difinir-se em relação a valores que o precederam. Os países subdesenvolvidos, ao contrário, devem esforçar-se para criar valores que lhes sejam próprios, métodos, um estilo que lhes sejam específicos FANON [2002]

Acerca de mais ou menos de seis anos, após uma longa jornada em busca do livro Biko, estava eu imerso nas páginas do mesmo, quando me deparei com a seguinte frase “por mais que falemos a sua língua, os nossos códigos lingüísticos, símbolos e representações são outros, por isso estamos em desvantagem”. Logo o “pós-colonializado” nunca se reconheceu como si próprio, como poderiam se auto-reconhecer, pois isso é impossível, até que inventem termos originais. Enquanto se contentarem em serem tratados e chamados pelos termos de eurocêntricos, serão incapazes de ser qualquer coisa, a não ser por meio de representações sociais euro-cêntricas é logo tapeado por nós[1] (MOSCOVICI, 2003, pp. 10, 21). A pior herança dos povos afro-africanos, do período do avassalamento[2] bio-físico e agora psíquico por des-colonizar é a programação cognitiva que até hoje os mata. Dessa forma, se faz necessário um real processo de des-civilização e conversão psíquica do homem afro-africano sendo este o caminho para real libertação. Percebi logo quão difícil e complexo para um afro-africano viver em um mundo dominado por representações, imaginário e estética euro-européia: em primeiro lugar pela falta de uma auto-fala e pelas representações criadas sobre si mesmo, fruto do imaginário euro-europeu racialista e racista; em segundo, por viver em sociedades multi-étnicos-raciais “pós-escravismo” e “pós-colonialismo” e preso em redes de relações raciais semi-pacificas, controladas por normas cristalizadoras de representações psico-negativas.

Nossas experiências e idéias passadas não são experiências ou idéias mortas, mas continuam a ser ativadas, a mudar e infiltrar nossa experiência e idéias atuais. Sob muitos aspectos, o passado é mais real que o presente. O poder e a claridade peculiares das representações – isto é, das representações sociais – deriva do sucesso com que elas controlam a realidade de hoje através da de ontem e da continuidade que isso pressupõe MOSCOVICI [2003]

O afro-africano sofreu a des-legitimação[3] político-psico-sócio-cultural e o epistemicídio euro-europeu, em relação a seu próprio imaginário sócio-cultural e contribuição intelectual e cultural milenar para a arte, filosofia e ciência. Desenraizados, perseguidos, frustrados e condenados a assistirem a dissolução das verdades nas quais sempre acreditaram. Como resultado dessa antinomia (a busca de um ISO e a negação do mesmo pelo eu hegemônico apesar de ser certificado pela branquidade) que coexiste com o homem afro-africano. Podemos tirar duas conclusões: que os brancos consideram-se superiores aos afro-africanos e que os afro-africanos desejam provar ao euro-europeu, a todo custo, o igual valor de seu intelecto. Tal provação levou e leva a um sofrimento vivenciado que atravessa os mecanismos psicológicos, a psíque do afro-africano que, assim como de todo e qualquer ser humano, tem funcionando em si. Esse sofrimento se mostra inconsciente e poderosamente ativo, porque instalado nas sombras do desconhecido. Porém, apesar de a psique humana trabalhar da mesma maneira, existem diferenças que se dão devidas a ordens e/ou fatores diversos. Fator genético que dá a cada um diferenças na percepção, desde a mais tenra idade, os relacionamentos que levam a cada pessoa, com singularidade, a inscrição em crianças dos traços da sua cultura étnica e fatores sociais que influenciam de forma decisiva, através de professores, médicos, chefes, artistas, psicólogos, padres (aparelhos ideológicos de Estado) e etc., elementos que colocarão o modo de ver o mundo, geralmente já perpassado pela visão de mundo da classe dominante (hegemônica).

São esses aparelhos chamados aparelhos ideológicos de Estado. Esse quadro complexo e sutil vai, aos poucos, sendo introjetado pela pessoa, na medida em que a repetição dos pontos de vista, das normas, faz com que ela sinta a pressão do grupo circundante e dominante ANDRADE [ ]

O euro-europeu dominador[4] quebrou a coluna dorsal do povo afro-africano dominado e oprimido, ou seja, os elementos essenciais para a manutenção do ser do povo afro-africano — sua cultura e religião. Essa violência tem levado o homem africano, tanto em África quanto na Diáspora, a lutar e buscar reconhecimento, e certificação ISO[5], aprovação ou aval por parte do euro-europeu, para se sentir realizado ou capaz. Fanon adequadamente coloca:

O homem só é humano na medida em que ele quer se impor a um outro homem, a fim de ser reconhecido. Enquanto ele não é efetivamente reconhecido pelo outro, é este outro que permanece o tema de sua ação. É deste outro, do reconhecimento por este outro que dependem seu valor e sua realidade humana. É neste outro que se condensa o sentido de sua vida FANON [2008]

Levando o próprio afro-africano a um comportamento psico-patológico em todos os âmbitos e sentidos, aprofundando e clivando as sócio-patologias, convertendo-as nas psico-sociopatologias introjetadas[6] e naturalizadas como constitutivos do próprio sujeito afro-africano[7]. Para Fanon (2008), o preto tem duas dimensões. Uma com o seu semelhante e outra com o branco. Um preto comporta-se diferentemente com o branco e com outro preto. Não há dúvida de que esta cissiparidade é uma conseqüência direta da aventura colonial. Ninguém pensa em contestar que ela alimenta sua veia principal no coração das diversas teorias que fizeram do preto o meio do caminho no desenvolvimento do macaco até o homem. Assim o afro-africano se apresenta e vive de comparação, há uma preocupação constante com a autovalorização e com o ideal de ego. Sempre que entra em contato com um outro semelhante, advêm questões de valor e mérito. Humilhando o seu semelhante de diversas formas, constituindo-se assim ele mesmo um “homicida”.

Tentem compreender o “sentido” e a direção dos fenômenos mórbidos sem levar em consideração este objetivo final, e vocês se encontrarão logo diante de uma multidão caótica de tendências, impulsos, fraquezas e anomalias, feita para desencorajar uns e suscitar em outros o desejo temerário de penetrar, custe o que custar, nas trevas, arriscando-se a voltar com as mãos vazias ou com um despojo FANON [2008]

Assim após a aceitação dos preconceitos do Eu hegemônico, o afro-africano, em posse de tal introjeção, ataca com ferocidade a sua psico-somatología com a intenção de aniquilar e destruir sua auto-imagem e corpo, que leva a uma forma negativa de expressar seu valor. Este fenômeno é facilmente observado nos homens de cor com algum tipo de sucesso: financeiro, econômico, social, intelectual, esportivo, artístico, etc. Daí vemos geralmente os pretos intelectuais criarem escolas nos moldes ocidentais, lecionarem tendendo a ser mais exigentes, lutam para demonstrar uma erudição que chega ao ridículo. A dominação e o conhecer profundamente as teorias e conceitos postulados ocidentais converte-se na primeira arma para desqualificar e provocar seu auto epistemicídio. Sendo assim, no afro-africano civilizado a estupefação chega ao cúmulo, pois ele está perfeitamente adaptado. Com ele o jogo não é mais possível, é uma perfeita réplica do euro-européu. Chegando a realizarem exibições de citações de intelectuais brancos, diante de uma platéia branca e entre os seus não instruídos, criando a imagem do reconhecido e vitorioso na luta pelo ideal de ego euro-européu, e os com sucesso econômico-financeiro em especial a se tornarem consumistas de primeira ordem e grandeza e valorizando um status corrompido do ser homem de cor.

Para entendermos como tais construções ocorrem, o caminho lógico é examinar a linguagem, na medida em que é a partir dela que criamos e vivenciamos os significados. Na linguagem está a promessa do reconhecimento; dominar a linguagem, um certo idioma, é assumir a identidade da cultura. A questão da língua também levanta outras questões mais radicais sobre seu papel na formação dos sujeitos. Assim, todo povo colonizado – isto é, todo povo no seio do qual nasceu um complexo de inferioridade devido ao sepultamento de sua originalidade cultural – toma posição diante da linguagem da nação civilizadora isto é, da cultura metropolitana” FANON [2008]

O europeu ou o branco em África como em todos os lugares, que por uso de um belíssimo onde o dialogo não é cogitado[8] conquistou na era moderna, acabou por se transformar no autóctone e transformando o autóctone em o estrangeiro o Outro. Des-legitimando os direitos naturais de quem encontrou na parcela geográfica e legitimando seus atos sobre os membros da sociedade em que se tem o novo domínio bélico. Passando a legitimar com a promoção da civilização européia todo seu ato contra o Outro, neste caso o autóctone, não devemos esquecer que o branco é o forasteiro, o estrangeiro, o que veio saquear e seqüestrar. Assim permaneceu de forma clara e aberta até as independências, em África e no resto do mundo colonizado, e permanece por meio de novos mecanismos de dominação obscuro em nossos dias sua condição de espoliador. O preto africano, como espoliado, permaneceu e permanece espoliado, não mais de forma física, e sim psíquica, logo, carrega em si elementos, símbolos, significâncias que o levam sempre a exaltar de alguma forma a Europa e o euro-europeu e os indivíduos que mais se aproximam fenotipicamente ao branco (fruto de cruzamentos étnico-raciais branco com outros grupos raciais). Com isso a naturalização da auto-negação e flagelo, tornam-se algo natural: como alisar um cabelo, refinar o nariz, preferir os nomes e línguas européias, vestimentas, termos preferência em se relacionar com branca (o)s e na falta os mulatos-mestiços.

O euro-europeu espoliador, detentor de poder, adota, segundo suas necessidades, o procedimento de controle da produção coletiva, sem abordarem diretamente os usos e costumes do povo dominado, extraindo “somente” o produto do trabalho alheio ou, o que tem sido encontrado amiúde, a dominação econômica, política e cultural/religiosa. É este o processo de sonegação do direito à auto-afirmação, fruto de um processo de des-legitimação político-sócio-cultural em relação à África e ao afro-africanos.

O peso de sua historia dos costumes e conteúdo cumulativo nos confronta com toda a resistência de um objeto material. Talvez seja uma resistência ainda maior, pois o que é invisível é inevitavelmente mais difícil de superar do que o que é visível MOSCOVICI [2003]

A conversão[9] é então entendida como um processo de tornar-se diferente do que era sem deixar de ser o que foi.[10] A colonização apresentada como um dever, invocando a missão civilizadora do Ocidente, competia à responsabilidade de levar o africano ao nível dos outros homens (o euro-europeu). Tal clima de alienação atingirá, profundamente, o preto, em particular o instruído, que tem assim ocasião de perceber a idéia que o mundo ocidental fazia dele e de seu povo. Na seqüência, perde a confiança em suas possibilidades e nas de sua raça, e assume os preconceitos criados contra ele. É nesse contexto que nasce a negritude. Era tempo de buscar outros caminhos. A situação do negro reclama uma ruptura e não um compromisso. Ela passará pela revolta, compreendendo que a verdadeira solução dos problemas não consiste em maquiar-se de branco, mas em lutar para quebrar as barreiras sociais que o impedem de ingressar na categoria dos homens.

Em meio a esse processo de libertação, assiste-se a uma mudança de termos, pois abandona a assimilação e a liberação do negro se da pela busca de uma certificação Ori[11] que o torna preto, efutua-se pela reconquista de si e de uma dignidade autônoma. O esforço para alcançar o branco exige total auto-rejeição; negar o europeu será o prelúdio indispensável à retomada de uma condição anterior a des-legitimação sofrida. É preciso desembaraçar-se desta imagem acusatória e destruidora, atacar de frente a opressão, já que é impossível contorná-la. Aceitando-se, o preto afirma-se cultural, moral, física e psiquicamente. Ele assumirá a cor negada e verá nela traços de beleza e de feiúra, como qualquer ser humano “normal”.[12] A tomada de posição ideológica, a conversão psíquica em relação à ancestralidade africana e herança dos processos psíquicos[13] histórico-social, a auto-definição e novas representações sociais criadas para si dentro do ideal de ego afro-africano, além da crítica em relação a essa des-legitimação, usando a legitimação para des-legitimizar a des-legitimação oficial do Estado e seus aparelhos de controle (AIE) [14].

Uma forma de expressar a visão que essas relações para com o Outro parecem alimentar seria dizer que ele nega os estereótipos, as exclusões, a dominação que visam o Outro. Seria demasiado longo explicar aqui, mas serio que o, em todas as circunstâncias, o Outro está exatamente ausente ou invisível. Eu prefiro dizer que são representações sociais, pois se julgamos verdadeiras ou falsas, é sempre com relação a uma norma que admitimos e consideramos lícita (MOSCOVICI In: ARRUDA, Ângela (org)., 2002, pp. 8-9).



Por: Nkuwu-a-Ntynu Mbuta Zawua




[1] O euro-europeu hegemônico liberal ou progrecista apesar de seu interesse e suposto defensor das lutas e causas dos afro-africanos. E este defensor é o próprio obstáculo epistemológico, pois é parte do sistema de dominação, assim como foram os emancipacionistas e maioria dos abolocionistas. O afro-africano diante do nós é aprisionado por querer uma fala menos universal e, mas de recorte étnico nas soluções de problemas que se apresentam universais, mas de características específicas e atuam de forma específica no tecido social, das sociedades multirraciais e étnicas, logo o afro-africano fica em situação de inércia. Este mecanismo de controle do nós é quase que automático por parte do homem vivent na branquidade, o torna incapaz de se liberar de sua herança hegemônico e viver de acordo com seus ideais, por se dar na esfera da psico-histórica.
[2] Segundo Sidi Askofaré, dos procedimentos simbólicos do avassalamento resultam um tipo de dominação real do corpo que teve de ser apoiada em uma dominação simbólica, política, ideológica e em uma repressão social do reprimido. A característica fundamental da repressão não é que destrói ou suprime o que sucumbe à ela, mas que mantém isolado o que sucumbiu, ao tempo em que conserva seu poder atividade, efetividade e eficácia. Por isso, não existe repressão sem retorno do reprimido. Daí os sintomas que dizem a seu modo o que não pode ser dito, formulado, liberado ou reconhecido (ASKOFARÉ apud GERBASE, 2008).
[3] De desligar, desunir-se, quebrar a aliança do legítimo que dá o reconhecimento como legítimo ou autêntico, tirando assim a qualidade e o reconhecimento do legítimo. A escolha do termo des-legitimação para explicar o desligamento de manifestações e criações fruto do espírito humano. Des-legitimação é o processo de perda da identidade étnica (da essência daquilo que é indivisível) por meio da simbologização que nacionaliza (universaliza a cultura como ferramenta para o apagamento de uma memória coletiva e individual, fenotipização e fenogonização), que naturalizão manifestações e ou criações matricialmente étnicas. Imposta pelo dominador, onde o criador perde a legitimação e o dominador apresenta-se como criador de algo que nunca criou, acabando assim por se transformar no autóctone e transformando o autóctone em o estrangeiro, ou melhor, o desligando de sua essência e direitos naturais. Tem sua base teórica e conceitual no direito de propriedade intelectual, onde: ex. só o vinho espumante produzido na região francesa de Champagne, tem o direito a carregar em seu rótulo o nome de Champagne, assim como o queijo parmesão todos os outros são vinho e queijos tipo parmesão.
[4] A minoria dominante de origem européia recorria não somente à força, à violência, mas a um sistema de pseudo-justificações, de estereótipos, ou a processos de domesticação psicológica. A afirmação dogmática da excelência da brancura ou a degradação estética da cor preta era um dos suportes psicológicos da espoliação (GUERREIRO apud SOVIK In: WARE (org), 2004, p. 367). [5] O dominador, detentor de poder, adota, segundo suas necessidades, o procedimento de controle da produção coletiva, é por este processo de des-legitimação da auto-afirmação, por menacinismos político-piso-sócio-culturais. Desse processo, a certificação pela intervenção da branquidade se apresenta, o reconhecimento do outro se faz assim por meio de padrões europeus convertidos em norma universal. O Outro totalmente totalmente desinformado a respeito do que realmente seja uma certificação, a abraça de forma psico-patológica. Então o liquidificador da certificação é acionado, a embalagem que garante uma aparência branca aos produtos não europeus. Escondendo uma série de fatores que demonstram o quanto os ISO’s, des-legitimam. Logo a certificação naturalizada como condição sine qua no nas organizações e os que desejam conseguir destaque no cenário nacional e, conseqüentemente, no internacional num mundo onde a norma é branca.
[6] A marca ou sinal de referência, que o valor induz a partir do ideal, que reivindica, veicula um imperativo e, por conseqüência, uma proibição. Razão por que o valor negativo é, indubitavelmente, menos o posto do valor positivo do que a sua inversão, cujo sentido sublinha, de modo irrisório, a precariedade da proibição que o define, e a transformação da sacralidade, que o institui (RESWEBER, 2002, p. 24).
[7] Por uma série de razões, o preto foi cortado dos mecanismos normais de compaixão e de identificação. Foi sobrecarregado pelo peso dos antigos medos associados à sua cor; sofreu as conseqüências de uma imensa barreira cultural, que atingiu seu auge por intermédio da sensibilidade dos europeus em relação à sexualidade não-reprimida; carregou o estigma de todos vícios para os quais a escravidão o empurrou; e o próprio espírito da ciência secular que levou a emancipação à mente européia tendeu a relegá-lo a uma posição de inferioridade natural (DAVID, 2001, pp. 530-531).
[8] Para mais consulte HANSON, Victor Davis. Porque o ocidente venceu – massacres e cultura – da Grécia antiga ao Vietnã. Rio de Janeiro, Ediouro, 2002.
[9] Em Vygotsky, a conversão é o processo de superação e de mediação não estando a questão na internalização de algo de fora para dentro, mas na conversão de algo nascido no social que se torna constituinte do sujeito permanecendo “quase social” e continua constituindo o social pelo sujeito. O eu não é sujeito, é constituído sujeito em uma relação constitutiva eu-outro no próprio sujeito, essa relação é imprescindível para a constituição do sujeito, já que para se constituir precisa ser outro de si mesmo. É necessário o reconhecimento do outro como eu, alheio nas relações sociais, e o reconhecimento do outro como eu próprio, na conversão das relações interpsicológicas em relações intrapsicológicas; mas nesta conversão, que não é mera reprodução, mas reconstituição de todo o processo envolvido, há o reconhecimento do eu alheio e do próprio e, também, o conhecimento como autoconhecimento e o conhecimento do outro como diferente de mim. Porém, o conhecimento não é só reconhecimento, o ato de conhecer pressupõe a experiência e a imaginação, o mundo do imaginário e do possível diferente do mundo real, mas que está estreitamente relacionado com a realidade social. A conversão é entendida como um processo de tornar-se diferente do que era sem deixar de ser o que foi (MOLON, 2003, pp. 98-99, 112).
[10] Para sobre a conversão consulte WEST, Cornel. Questão de raça. São Paulo, Companhia das Letras, 1994.
[11] E ORI é a palavra mais culta porque é o homem, sou EU. Porque é o indivíduo, a identidade. A identidade individual, coletiva, política, histórica. ORI é o novo nome da história do Brasil. ORI talvez seja o novo nome do Brasil. Este nome criado por nós, a grande massa de oprimidos, reprimidos. Reprimidos antes, depois oprimidos, torturados. Transgressores. ORI passa a acompanhar quando o Movimento procura o processo de institucionalização. Os processos abertos da fala (NASCIMENTO apud RATTS, 2007, p, 65).
[12] MUNANGA, Kabengele. Negritude - usos e sentidos. Ed. 2°. São Paulo, Ática, 1988, p. 9. [13] Nascemos para o mundo já como membros de um grupo, ele próprio encaixado em outros grupos e com eles conectado. Nascemos elos no mundo, herdeiros, servidores e beneficiários de uma subjetividade que nos precede e de que nos tornamos contemporâneos: seus discursos, sonhos, seus recalcados que herdamos, a de que servimos e que nos servimos, fazem de cada um e nós os sujeitos do inconsciente submetidos a esses conjuntos, partes constituídas e constituintes desse conjunto (KAES apud Bento, 2002, p. 45).
[14] São aparelhos ideológicos do Estado: igreja, família, educação, justiça, política, sindicato, cultura e informação, têm como função a manutenção e a reprodução social (ALTHUSSER, 2007, pp. 66-72).



A IDADE DA RAZÃO


Artista: Keita Mayanda

Música: A idade da razão
Álbum: O homem e o artisa

Ano: 2006
Editora: Wakuti Música


Versão I


O tempo aumenta a nossa capacidade
De engolir sapos à medida que avança a idade
A revolta sorri por breves momentos
Aceitamos ver a vida com demasiados tons de cinzento
Aos 16 anos éramos inconformados
Dispostos a ser a voz dos que estão calados
Aos 27 só já queremos ter as nossas coisas
Desencantados com a vida e suas prosas
Pergunto então: o que quero pra mim?
Vou aceitar a situação e viver a vida assim?
O profundo responde-me: vou fazer o que sempre quis
Se ouvir sempre o mundo nunca serei feliz
Vou afirmar o que penso
Tornar pequeno este mundo imenso
Trazer às pessoas o brilho do sol depois de um dia chuvoso
Quero propor a esperança de um futuro radioso
Continuo a sangrar nas letras a noção
De um mundo perfeito com leite e pão
Com mulheres interessantes e homens honestos
Com justiça social e dirigentes lestos
Mas a realidade chama-me de volta à bofetadas
Este é o mundo das verdades enganadas
A humildade me diz
Só posso dar ao mundo a mudança que em mim já fiz
A presunção afasta-me da lucidez que preciso
Pra fazer poesia sobre as ruínas que piso

Refrão


O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas
Que a aurora da minha vida não vem cedo
Pra enfrentar a violência da tempestade sem medo
Depois dela vem sempre a bonança

Que é como um abraço fraterno ou o sorriso de uma criança
O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas


Versão II


Eu falo de coisas simples das coisas que vivo
Que me deixam num estado eufórico ou depressivo
Revolta, sinto
Pelos sonhos afogados em barris de vinho tinto
Esperanças antigas inundadas de percevejos
Quero de volta as moedas que um dia joguei no poço dos desejos
Quero agora a vida que a vida não me deu
Preciso conversar com DEUS ELE fez-me ateu
Porque esse mundo é muito à toa e as pessoas não prestam
A indiferença me magoa poucas coisas boas me restam
Tar com os amigos a passear de cima a baixo
Compor a ver se no beat me encaixo
Os momentos de recolhimento em que converso comigo
Caminhar de noite, tendo só as estrelas como abrigo
Eu atingi a idade da razão
Estou na encruzilhada da vida, tenho de tomar uma decisão
É a idade das opções difíceis
Da busca daquilo que nos fará felizes
É a idade de estar só com as pessoas
Que nos dizem na cara aquilo que nos dizem nas costas
É a idade da tranquilidade
Das verdades que afastam ou preservam a amizade
De estar sozinho por vontade
Do autoconhecimento e humildade
Que trazem sempre a lucidez necessária
Pra se preservar uma consciência revolucionária.


Versão III*


Segunda metade dos vinte 26 anos
A cabelo está a cair
A barba está mais rija
O olhar mais cansado também
Porque o tempo deixa as suas marcas
Fora
Mas dentro também
E as de dentro são se calhar as mais profundas
E as exigencias são muito maiores quando se está perto dos 30
Quando se está a olhar já pros 30
Vejo os meus amigos todos
Alguns com filhos
Alguns casados
Mas todos com os olhos no futuro
A idade da razão


Refrão*


O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas
Que a aurora da minha vida não vem cedo
Pra enfrentar a violência da tempestade sem medoDepois dela vem sempre a bonança


Que é como um abraço fraterno ou o sorriso de uma criança
O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas

O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas

O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas
Que a aurora da minha vida não vem cedo
Pra enfrentar a violência da tempestade sem medoDepois dela vem sempre a bonança
Que é como um abraço fraterno ou o sorriso de uma criança

O tempo veio falar comigo e disse-me coisas estranhas
Disse-me para estar atento quando caírem as folhas castanhas


* Inserido por nós : : Tabus Afro-Africanos : :